16/01/2018

8.310.(16jan2018.13.44') Vasco Gato

Nasceu a 30mar1978...Lisboa
onde trabalha como tradutor.
Publicou as seguintes obras: Um mover de mão (2000), Imo (2003), Lúcifer (2003), 47 (2005), A prisão e paixão de Egon Schiele (2005), Omertà (2007), Cerco Voluntário (2009), Rusga (2010), Napule (2011), A Fábrica (2013), Fera oculta (2014).
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“segredo segreda-me a canção dos dias sem que nos oiça a noite terrível e deixa que dance em mim a voz, a voz azul que é o lugar onde o mundo não pára de nascer. segreda-me o teu nome, agora, e farei de nós o amor, a constelação, o sonho de uma estação”
https://escritores.online/livros/um-mover-mao/
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Vasco Gato fala-nos de um lugar de figurações, tensões abstractas, ambiguidades, analogias, predomínio de um Eu impessoal sobre um Eu empírico. Tudo aí é significativo, recíproco, convertível, correspondente Esta poesia afirma o primado da imagem metafórica.

https://escritores.online/livros/imo/
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(…) Falo de um homem que possuía livros de poemas. Foi talvez o único real leitor de poesia. Ele abria os livros, um livro. Escolhia um poema. Era um ritual misterioso. Porque ele raspava as letras da página, cuidadosamente, como para conservar a integridade do papel. Raspava e reunia os pedaços negros. Aquecia então água com o vagar próprio da vertigem. Uma estranha ciência de vapores. (…) Veio de muito longe o homem que me pagou todas as dívidas na cidade. Tinha cabelo liso e não falámos muito. Eu estava calmo. Dormi uma última noite antes de partir. A última noite é para o homem que veio de muito longe poder afastar-se. A última noite, não tenhas ilusões, é para ficar a dever. (…)

https://escritores.online/livros/omerta/
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9dez2017
UM DIZER AINDA PURO
imagino que sobre nós virá um céu
de espuma e que, de sol em sol,
uma nova língua nos fará dizer
o que a poeira da nossa boca adiada
soterrou já para lá da mão possível
onde cinzentos abandonamos a flor.

dizes: põe nos meus os teus dedos
e passemos os séculos sem rosto,
apaguemos de nossas casas o barulho
do tempo que ardeu sem luz.
sim, cria comigo esse silêncio
que nos faz nus e em nós acende
o lume das árvores de fruto.

diz-me que há ainda versos por escrever,
que sobra no mundo um dizer ainda puro.

https://escritores.online/escritor/vasco-gato/
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Via Graça Silva
Que não se enganem os que compram as horas por atacado para do teu suor extraírem a bandeira de um país que nunca será o da atenção que nunca será o da morada mas sempre e sempre o território homeopático da extinção em que os troféus são joelhos vergados à condição de cera para os soalhos do progresso cujo verdadeiro nome é despovoamento Vender-te-ão o conforto a perseverança o brio como se tivéssemos por fito a acumulação do tempo sem o fruirmos boca a boca desesperadamente garantir o futuro dir-te-ão sem repararem na estupidez do repto pois que poder temos nós sobre as válvulas biológicas do nosso prazo pra nos arrogarmos a garantir o que quer que seja quanto mais o sumo fruto da inexistência esse futuro-cano-enfiado-na-boca para ser disparado sem falta de manhã e ao deitar Em volta sucedem-se clarões e abismos inóspitos os elementos torcem-se na pesca à linha dos lugares fundamentais há uma convulsão de panorama para o brevíssimo turismo dos olhos mas o importante é a matemática mesquinha do sangue que furtamos uns aos outros a medalha de carne pútrida com que esperamos aparecer na fotografia da época Que se foda a época digo-te já que se foda a sépia dos futuros eu quero aparecer no dia do teu nascimento desarmado como uma árvore sem outra missão que não amparar-te o susto e dizer-te baixinho bem-vindo ao continente dos frágeis podes parar de nadar

Fera Oculta IV..." é um livro pequeno escrito para o filho quando este estava para nascer"